vermelho

Sinto o embate de um veloz automóvel descontrolado. Agarro a certeza da escuridão, quando tudo é névoa diante dos faróis assombradores que me atiram à face. Tudo o resto é pó debaixo dos pés descalços, confundidos com a gravilha e o negro alcatrão quente que piso.

Desponto do torpor em que mergulhei, e numa fração de segundos, encabeço um chorrilho de questões. Toda eu sou sangue, dor e confusão. Os sapatos perdidos no meio do caos. Cacos de vidros estilhaçados pelo chão.

Ali eu, queda e muda, sem reação, olhava a imponente tesoura que cortou a meio a raiz do meu ser. Experimento o som da ganga cortada, enquanto choro pela minha saia nova, a estrear. Agora ali, transformada em não mais que um farrapo, agastando-me as feridas sangrentas.

Arrepio-me em silêncio, enquanto choro baixinho agarrada ao fecho da blusa branca com riscas vermelhas, também ela a estrear. Tudo arrancado de mim, como um dente estragado que se extrai a sangue frio. O frio invade-me, conquanto um fino lençol cubra o meu corpo desnudo.

Não mais voltei a vestir vermelho. Cravada em mim ficou a memória de que o vermelho cavou a ponte da nossa separação. Pois nessa noite, a roupa foi a menor perda que sofri…

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